sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

Atriz da Globo relata agressões e falta de água em aldeia de Dourados: ‘Triste’

A atriz, que viveu Benvinda em "No Rancho Fundo" da Globo, é de origem tupi-guarani e cresceu em Três Lagoas; Ela disse que chegou a distribuir os galões de água que tinha no carro

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Dandara Queiroz expôs situação de indígenas da Reserva Indígena de Dourados (Foto: Reprodução/Instagram @dandarajqueiroz/Arquivo pessoal)

Dandara Queiroz, 26, publicou vídeo em rede social denunciando falta de água potável na Reserva Indígena de Dourados (MS) e lembrou repressão sofrida por indígenas na localidade. Em conversa com a reportagem, ela detalha o cenário encontrado no local. O governo federal diz acompanhar o caso e tomar providências.

“Ver a necessidade daquelas pessoas, a sede, a falta de água pra se refrescar, pra tomar um banho… Isso me deixou muito triste e indignada. Como de costume, a primeira coisa foi perguntar o motivo daquela escassez. E foi assim que eu fiquei sabendo que esse é um problema recorrente daquela comunidade”

A atriz, que viveu Benvinda em “No Rancho Fundo” da Globo, é de origem tupi-guarani e cresceu em Três Lagoas (MS).

Ela disse que chegou a distribuir os galões de água que tinha no carro: “Deixamos lá, então eu os vi racionando os litros entre as famílias que estavam ali. O caminhão-pipa vai uma vez por semana. No feriado ele não foi, então já faziam duas semanas que essas pessoas estavam sem água”

Em seu vídeo, a atriz lembra que em novembro de 2024 a população fez um protesto exigindo, dentre muitas demandas, água.

“Eles foram recebidos com gás, opressão. Depois desse protesto, foi dito que seriam feitos poços [artesianos]. Isso foi em novembro de 2024 e até agora nada o projeto, que era pra ser entregue em março mas não está perto de ser finalizado”.

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Dandara Queiroz costuma visitar a reserva indígena, pois mantém projetos com artistas locais (Foto: Arquivo pessoal)

A reportagem questionou a SEJUSP-MS (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul) sobre o episódio de 2024 e se houve algum ocorrido semelhante recentemente. Por e-mail, a assessoria do órgão disse que daria um parecer sobre a questão na tarde desta segunda-feira (10), mas não houve retorno até o momento.

Com a voz embargada, Dandara falou em seu vídeo que é muito triste e desesperador a situação dos conterrâneos indígenas.

“Eu estive lá, eu vivi essa realidade. São crianças, são idosos, são pessoas de todas as idades. O açude que tem lá próximo onde eles também pegam água é completamente poluído por agrotóxicos das fazendas que tem em volta. Como que eles vão consumir essa água?”.

A Sanesul (Empresa de Saneamento de Mato Grosso do Sul), disse a Splash que a questão das aldeias indígenas “é um assunto complexo” e que há uma secretaria específica do governo estadual no comando das ações. A companhia disse ainda que enviaria um parecer sobre o assunto. O Gabinete da SEC (Secretaria de Estado da Cidadania) foi procurado desde ontem, mas não retornou contato.

Questionada sobre o assunto, a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) afirmou que por se tratar de saneamento básico e abastecimento de água, a questão deveria ser respondida pela Sesai (Secretaria de Saúde Indígena), do Ministério da Saúde. O órgão informou que há o fornecimento de distribuição de água e que recursos foram alocados para projeto de perfuração de poços artesianos.

Indígena sofrem com falta de água potável em Dourados

Dandara Queiroz reforçou que exigir água é o mínimo.

“A resistência já é uma luta difícil, a gente luta pela terra, a gente luta contra intolerância religiosa, contra abuso, contra fome, contra a água, não dá, água é é o mínimo. Água é o mínimo. E isso não está tendo, não tem. (…) Isso é desumano, é desumano, é terrível”.

“Já faz tempo que eles pedem ajuda e providências para esse problema de anos, mas nada foi resolvido. Então, os indígenas daquelas comunidades resolveram ir até a rodovia em um ato de desespero, para chamar atenção para aquela realidade que estavam vivendo. E foram recebidos com violência, gás lacrimogêneo, tiros de borracha, entre outros. Naquela região, os ataques contra os povos indígenas são muito frequentes.  São alvejados nas lutas de retomadas de território, oprimidos por conta da intolerância religiosa, abusados em diversos aspectos? Fora os problemas de fome, educação e, como vimos, até a sede”

ASSISTA:

A REPERCUSSÃO

A reportagem entrou em contato com pelo menos sete órgãos públicos das três esferas em busca de posicionamento quanto à falta de água potável para os indígenas em Dourados. Somente três mandaram explicações detalhadas.

A Prefeitura de Dourados explicou que a falta de água potável na RID (Reserva Indígena de Dourados) é crônica. Alegou que se arrasta desde meados de 1990, quando os mananciais começaram a secar e o consumo aumentou em razão do crescimento populacional.

A atual gestão, que assumiu em janeiro, admite que “tem olhado a questão com preocupação”. O executivo municipal também atribuiu a responsabilidade da oferta de água como sendo do governo federal “que não tem conseguido solucionar o problema”, informa em nota.

A Prefeitura diz ainda que tem cobrado a rapidez no processo de licitação para perfuração de “superpoços artesianos”, porém eles não seriam suficientes. “O sistema de distribuição de água potável na Reserva Indígena é deficitário, de forma que a água não chegará a todos os lugares mesmo com a perfuração dos poços”, reconhecem.

Dandara Queiroz afirmou que mesmo com a visibilidade do seu vídeo, não houve um pronunciamento oficial. “O vídeo teve repercussão no sentido de expor uma realidade que muita gente não faz ideia que acontece. Muitas pessoas marcaram os órgãos responsáveis e compartilharam. Mas até agora, não tivemos nenhuma resposta, nenhum pronunciamento”, disse.

Ela lembra que o projeto prometido em novembro não está pronto e que os caminhões-pipas que abastecem as casas na RID não são suficientes.

“O meu intuito era chamar atenção pra esse descaso, cobrar as soluções que já foram prometidas e ainda não foram cumpridas. Cadê esses poços artesianos?! Em novembro, após esse protesto, foi dito que no máximo até março os poços estariam em funcionamento para toda a comunidade”

Por meio de nota, o MPI (Ministério dos Povos Indígenas) informa que o direito à água e ao saneamento “é garantido pelo Governo Federal sob a competência da Secretaria de Saúde Indígena, do Ministério da Saúde”.

A pasta diz que atua em articulação com com o Ministério da Saúde e outros órgãos para “avançar em medidas estruturantes com foco no abastecimento nas aldeias de todo o país”.

O MPI diz ainda que há três projetos em andamento focados na garantia de água potável na RID. Um deles prevê a construção de dois poços de água como ação emergencial com a destinação de R$ 2 milhões em recursos. Há a perfuração de poços em conjunto com a UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) totalizando até 20 poços — são sete no momento —, e 30 caixas d´água para as famílias.

Há ainda um terceiro projeto em curso que prevê a construção de sistemas de abastecimento de água com recursos do Focem (Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul). Ao todo são R$ 80 milhões investidos no projeto, com quase R$ 22 milhões previstos para serem executados em comunidades indígenas de Mato Grosso do Sul, segundo o MPI.

Já o Ministério da Saúde afirma que acompanha “com prioridade a situação do abastecimento de água na RID”. A pasta informa que também destinou R$ 2 milhões para a perfuração de quatro poços artesianos, conforme estudos realizados pelo DSEI-MS (Distrito Sanitário Especial Indígena – Mato Grosso do Sul), e investirá mais de R$ 3 milhões na contratação de uma empresa especializada em engenharia para ampliar e aprimorar o sistema de abastecimento das Aldeias Jaguapiru e Bororó.

Todas as medidas cabíveis estão sendo adotadas para garantir o abastecimento adequado de água na Reserva Indígena de Dourados, com total transparência e compromisso do Ministério da Saúde e das entidades envolvidas diz o Ministério da Saúde, em nota.

Fonte: Portal UOL

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