segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Casal viaja com R$ 67 e percorre 11 mil km de bicicleta em 6 anos

Djoe Rosa e Iris Magalhães pedalam, em média, 60 quilômetros por dia — e, por enquanto, não pensam em voltar ao modo de vida tradicional

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Dia de chuva em Minas Gerais em 2018 — Foto: ARQUIVO PESSOAL

Ela era estudante de Arquitetura; ele, de Música. Mas ambos tinham uma paixão em comum: pedalar. Um hobby que logo viraria um projeto (e estilo) de vida.

A paulista Iris Magalhães e o gaúcho Djoe Rosa, ambos com 28 anos, já percorreram mais de 11 mil quilômetros de bicicleta pelo Brasil em seis anos. Uma jornada sem previsão de volta, compartilhada em tempo real pelo casal nas redes sociais.

Os dois se conheceram na Universidade de Pelotas, no Rio Grande do Sul, em 2016. E, antes de começarem a namorar, fizeram uma viagem de 40 dias de bicicleta pelo Uruguai.

Quando voltaram para a faculdade, engataram o romance. Mas algo havia mudado dentro deles. O sentimento de pertencimento, segundo Iris, não era mais o mesmo.

“Parecia que a sala tinha ficado pequena, e percebi quão jovem eu era. Falei para o Djoe para irmos ao México de bicicleta. A gente começou a se organizar e amadureceu a ideia”, diz ela à BBC News Brasil.

Mas como viajar para outro país sem antes explorar o Brasil? Eles decidiram então começar a jornada em território nacional.

O plano era sair do Sul, onde moravam, e explorar os seis biomas brasileiros.
“A gente, como brasileiro, tinha a mesma visão estereotipada do Brasil e com preconceitos. Não contávamos que seria tão grande. É um país extremamente diverso.”

Para se preparar financeiramente para a empreitada, os dois começaram a vender brigadeiro na faculdade.

Antes de qualquer coisa, eles precisaram adquirir bicicletas novas, uma vez que as que eles usavam para se locomover haviam sido roubadas no meio do processo.

“(Na) minha bicicleta, paguei R$ 50. É um modelo de 98, e é daquelas de comprar pão na esquina. Comprei de um amigo e fui montando com outras peças. No fim das contas, deve ter custado tudo uns R$ 700”, relembra Djoe.
Já Iris conseguiu uma bicicleta nova por meio de doação. “Fiz um post no Facebook falando do roubo, e um colega me ofereceu. Fui ver a bicicleta e saí pedalando.”

Com as bicicletas novas em mãos, eles colocaram na balança o que seria mais importante para uma viagem longa e de baixo custo. Decidiram investir então em uma boa barraca e em uma câmera de aventura barata para documentar a jornada.

Descanso à sombra das bicicletas no Jalapão — Foto: ARQUIVO PESSOAL

Partida com R$ 67 no bolso

Em fevereiro de 2017, os dois deixaram a universidade para trás para embarcar na aventura.

Saíram de bicicleta de Pelotas, no Rio Grande do Sul, e foram subindo em direção à Serra Gaúcha, passando pelas regiões dos cânions, pelo litoral de Santa Catarina, até chegar a cidades do Sudeste.

Como grande parte do dinheiro que eles juntaram havia sido usado na compra dos equipamentos e acessórios para a viagem, o casal iniciou a jornada com pouco mais de R$ 50.

“Saí com R$ 17 no bolso, e a Iris, com R$ 50”, relembra Djoe.
Eles dizem que a quantia foi suficiente no início. Isso porque, para se capitalizar, os dois faziam apresentações de música nas cidades que paravam — Djoe no violão, e Iris no pandeiro.

Naquela época, seis anos atrás, eles contam que gastavam apenas R$ 300 por mês — a despesa maior, segundo eles, era com alimentação.

Isso só foi possível pelo modo de vida simples e minimalista que adotaram, dizem.

“A gente cozinha nossa própria comida. Dorme na beira de rio, em postos de gasolina, faz voluntariado, fica hospedado na casa das pessoas”, afirma Iris.
Hoje, o gasto mensal do casal aumentou — mas, de acordo com eles, as principais despesas continuam a ser com alimentação e manutenção das bicicletas.

“Atualmente, gira em torno de R$ 1.500 a R$ 2.000 (por mês)”, afirmam.
Para se manter, além das apresentações musicais, o casal já fez capinagem, bico de garçom e vendeu brigadeiro.

Com o passar do tempo, eles viram necessidade de profissionalizar a produção audiovisual para as redes sociais. E decidiram investir em equipamentos novos.

“No começo da viagem, a gente só tinha um celular velho da Iris e uma ‘Go Pobre’ (câmera de aventura barata)”, lembra Djoe.

Para isso, eles contam que trabalharam oito horas por dia em uma fazenda em Brasília durante um mês.

Iris trabalhava como camareira no hotel da fazenda, enquanto Djoe fazia serviços gerais na agrofloresta. Nos finais de semana, Djoe ainda tocava no restaurante da fazenda, e os dois também faziam apresentações musicais em Brasília. Como tinham direito a alimentação e moradia na fazenda, dizem que o gasto deles era praticamente zero.

Depois de juntar dinheiro, foram até o Paraguai comprar câmeras mais modernas.

O investimento deu retorno. Desde 2020, eles ganham dinheiro com o canal do Youtube, que começou a ser monetizado após três anos de postagens.
Também promovem campanhas de financiamento coletivo e têm uma loja virtual na qual vendem adesivos e camisetas do projeto.

Trecho da estrada ‘sem fim’ entre Ponte Alta do Tocantins e Mateiros — Foto: ARQUIVO PESSOAL 

Dia a dia na estrada

Os desafios, no entanto, vão muito além da questão financeira. O casal conta que ao se deslocar pedala, em média, 60 quilômetros por dia — e é preciso ter muita disposição.

Para facilitar a jornada, eles utilizam equipamentos próprios para ciclismo.
“Usamos alforges, que são bolsas para bagagem. Não vai nada no nosso corpo, e isso facilita a distribuição do peso. É muito menos desgastante”, explica Djoe.

A alimentação também é estratégica. Como são vegetarianos, eles investem em uma dieta rica em frutas e legumes.

E, para não carregar muito peso extra, contam que levam apenas a quantidade necessária — além de adotar técnicas para evitar que a comida estrague.

O casal que foi viajar com R$ 67 e percorreu 11 mil km de bicicleta em 6 anos — Foto: ARQUIVO PESSOAL

“A gente carrega a comida em pedaços de panos para não acelerar o processo de decomposição. Preparamos sanduíche com tomate, pasta de amendoim e, no fim do dia, a gente vai ao mercado e compra comida suficiente para viver uns dois dias.”

A segurança também é pensada cuidadosamente. Eles costumam dormir em postos de gasolina ou pedem para montar a barraca no quintal de moradores locais. Segundo eles, tem muita gente desconfiada, principalmente nas cidades grandes, mas a maioria estende a mão aos cicloviajantes.

E há gratas surpresas no meio do caminho:

“Uma vez, estávamos pedalando, e uma mulher passou buzinando de carro nos chamando para tomar café na casa dela. Nós a seguimos, fomos até lá, tomamos café, depois fomos embora”, relembra Iris.

E como faz para tomar banho? Na maioria das vezes, eles tomam banho em postos de gasolina. Mas nem sempre da forma tradicional — eles contam que, às vezes, precisam usar lenço umedecido, e já chegaram a tomar banho de caneca e regador.

Há seis anos na estrada, o casal já pedalou pouco mais de 11 mil quilômetros, passando por 17 estados brasileiros.

Inicialmente, eles passavam meses em uma determinada cidade, mas essa estratégia estava estendendo demais a viagem.

Agora, o tempo de permanência varia de alguns dias a semanas, de acordo com as atrações locais e o interesse de cada um. nNo momento desta reportagem, eles estavam em Porto Velho, Rondônia, e faltava conhecer apenas um bioma da lista: o Pantanal.

Fonte: Portal G1

 

 

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